Entrevistamos Flávio Vasconcelos sobre “Tudo Que Eu Mesmo Inventei”

Flávio Vasconcelos
Foto: Elisa Maciel/ Divulgação

O cantor e compositor paulista Flávio Vasconcelos lançou no início de dezembro do último ano o disco “Tudo Que Eu Mesmo Inventei”, o segundo álbum solo da carreira. Com uma sonoridade inspirada na vanguarda paulista dos anos 60 a 80, o mais recente trabalho é uma reflexão sobre as idealizações no amor e na vida.

É sobre saber admirar, enxergar a verdade e se expressar de maneira inventiva”, contou o artista. Além disso, o disco disponível em todas as plataformas digitais foi resultado de um processo de composição que durou dois anos, e passou posteriormente pela pós-produção (com direção artística de Rômulo Fróes) entre 2023 e 2024.

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O Nação da Música conversou com Flávio Vasconcelos sobre “Tudo Que Eu Mesmo Inventei”, as inspirações para compor o disco e as percepções sobre o processo de produção.

Entrevista por Isabel Bahé

————————————– Leia a entrevista na íntegra:
Eu queria saber qual foi a inspiração que você teve para dar o título do álbum, que é “Tudo Que Eu Mesmo Inventei”. É um título bem interessante, assim dizendo.
Flávio Vasconcelos: Então, na verdade, esse título vem de um processo até bastante longo, mas a origem primordial é a música. Tem uma música que se chama “Tudo Que Eu Mesmo Inventei”, e ela é a canção que dá título ao álbum. Essa canção eu fiz muito pensando nessas nossas idealizações da vida, na maneira como a gente idealiza tudo: a nossa noção de mundo, as nossas próprias relações, o amor.

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De maneira bem direta, nessa música eu meio que falo – e até entendo – que muito do que me incomoda… Até digo na música: “Do que me incomoda é você, mas eu que te idealizei”. É parte de uma aceitação dessa vibe nossa, super comum, acredito eu, de idealizar as coisas e nos distanciarmos de uma realidade que é importante, especialmente quando estamos tratando de coisas concretas.

Esse disco foi feito mais ou menos nos anos pós-pandemia, certo? Foi em 2022 ou 2023, ou um pouco mais cedo?
Flávio Vasconcelos: Isso, em 2022. Comecei a me questionar muita coisa enquanto estava em casa. Fiz toda uma pré-produção e, em 2022, o trabalho foi ganhando forma. Aí em 2023 já estávamos finalizando tudo.

Vocês foram polindo o trabalho nesse período, certo?
Flávio Vasconcelos: Exatamente. Foi um processo de muita resistência, porque a pandemia, de certa forma, nos colocou nesse espaço de isolamento. E, ao mesmo tempo, isso fez muito sentido com o tema do álbum, porque esse momento de isolamento despertou em mim – e acredito que em muitas pessoas – essa tendência de “viajar na maionese”, digamos assim, de idealizar tudo.

Isso trouxe muitas respostas para mim, mas também me fez perceber mudanças significativas na forma como eu enxergava as coisas. Algumas coisas melhoraram, outras pioraram, mas tudo isso me fez buscar algo mais verdadeiro, mais profundo, algo que pudesse ser benéfico, tanto para mim enquanto indivíduo quanto para a sociedade enquanto coletivo.

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Com certeza. Faz muito sentido que, nesse contexto, você tenha falado sobre idealização, porque a pandemia foi um momento em que todo mundo estava mais introspectivo.
Flávio Vasconcelos: Sim, exatamente. Mas, ao mesmo tempo, acho que a gente precisa imaginar mais em outros sentidos, sabe? No sentido das fantasias positivas, por exemplo. Aquilo que a arte, a música, as cores nos trazem.

Então, enquanto eu refletia sobre essa necessidade de encarar a realidade, também entendi o quanto é importante permitir-se fantasiar, imaginar, criar. A invenção ocupa um espaço essencial nas nossas vidas. É um desejo pessoal meu, mas também acredito que, socialmente, a imaginação poderia causar algo positivo se fosse encarada de forma mais consciente.

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Concordo completamente.
Flávio Vasconcelos: Inclusive, enquanto estamos aqui, minha cachorrinha filhote está brincando ao meu lado! Ela é super pequenininha e cheia de energia. (risos) E isso me lembra dessa simplicidade de viver o momento, sabe?

No fim das contas, “Tudo Que Eu Mesmo Inventei” é sobre isso: equilibrar a realidade com a imaginação e entender que precisamos dos dois. É um trabalho sobre idealizações, mas também sobre deixar espaço para o que é genuíno, criativo e espontâneo na vida.

O que te motivou a trabalhar com o Rômulo Fróes nesse disco especificamente? Porque, pelo que parece, o trabalho deu muito certo, né?
Flávio Vasconcelos: Sim, deu muito certo. Foi, inclusive, uma experiência incrível ter um diretor artístico. A maneira como ele trabalha é muito interessante. No início, era quase como se ele fosse um professor. A gente se encontrava quinzenalmente, eu mostrava as músicas, e esses encontros tinham um ar de mentoria. Foi muito legal, porque me fez ganhar tempo – no melhor sentido da expressão – e ajudou muito no crescimento do projeto.

Gostei especialmente de ter essa orientação, alguém para ouvir e apontar uma direção. Produzir uma obra artística, como um álbum, é um processo complexo, porque você está tirando ideias das suas experiências, das suas limitações e das suas qualidades artísticas, sejam elas técnicas ou emocionais. Às vezes, não é fácil entender o que aquilo pode significar para o mundo, para os outros. Também é complicado manter um olhar autocrítico. Então, ter uma visão externa é essencial.

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Mas também acho perigoso pedir opinião para muita gente. Já me perdi em outros projetos mostrando para várias pessoas e ouvindo opiniões divergentes. Isso acaba abalando a confiança que você precisa ter no seu próprio tato artístico. Por isso, achei fundamental ter um diretor artístico. É um ótimo equilíbrio, porque ele aponta uma direção, ajuda a tomar decisões e conhece você de uma forma mais profunda, mas ao mesmo tempo distanciada, profissional.

No caso do Rômulo, ele é um artista genial, na minha opinião, e muito generoso. Ele oferece esse serviço de direção artística para outros artistas, especialmente para quem quer reunir composições para um disco. Como ele já fez muitos álbuns e participou de tantos outros, tem um olhar muito apurado para perceber direções, organizar ideias e criar coerência no repertório musical.

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Como você definiria a sonoridade desse disco?
Flávio Vasconcelos: Acho que é um disco de música popular brasileira, a famosa MPB. Mas confesso que falar sobre gênero musical hoje em dia é um pouco complexo para mim, porque as coisas se misturam muito. Esse termo, MPB, talvez já não faça tanto sentido nos tempos atuais.

Se eu tivesse que inventar um termo, diria que é “música progressiva brasileira” ou “música profunda brasileira”. Gosto dessa ideia de “música progressiva brasileira”, porque uma das minhas grandes influências foi a música progressiva dos anos 70 – algo que vem muito do meu pai. Ele ouvia bastante, e isso me marcou muito. Também tem influência dos Mutantes, dessa vibe mais experimental e cheia de cores.

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Por outro lado, o “popular” da MPB talvez não se encaixe tanto no meu caso, se formos levar ao pé da letra. Então, penso que “música progressiva brasileira” é uma maneira de me identificar, embora ainda esteja dentro do guarda-chuva da MPB.

Você escolheu regravar uma música no álbum: “Sei dos Caminhos”. Por que essa música especificamente?
Flávio Vasconcelos: Essa música é muito especial para mim. Eu a acho maravilhosa. A letra é um exemplo de genialidade. Ela consegue dizer algo tão direto, mas ao mesmo tempo profundo e maduro. A ideia de “Sei dos caminhos, sei de tudo, só não sei como chegar ao próximo passo” é algo que ressoou muito comigo, especialmente nesse meu processo de amadurecimento.

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Essa música foi uma das primeiras coisas que gravei, bem no início, lá por 2020. Fiz uma gravação caseira, e ela acabou entrando no álbum quase do jeito que estava. É a única faixa que praticamente não foi regravada no estúdio. Apenas remasterizamos e ajustamos para encaixar na sonoridade geral do disco. Ela carrega muito do começo desse projeto e, para mim, quase que fecha o álbum de forma simbólica.

Para finalizar, uma pergunta reflexiva. Seu disco é muito pessoal e subjetivo, trabalhando temas individuais de diversas formas. Quando você olha para o trabalho completo, qual é a mensagem que ele passa sobre você?
Flávio Vasconcelos: Acho que é uma vontade de despertar, nem que seja minimamente, essa sabedoria de admirar. Queria sugerir às pessoas que aprendam a admirar mais as coisas, os processos, o mundo, as cores, os detalhes da vida. Por isso o disco traz tantas instrumentações e nuances diferentes.

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A música, para mim, é uma forma de colocar essa possibilidade no mundo. Quero sugerir que as pessoas aprendam a olhar ao redor com mais admiração e curiosidade. No fim das contas, concordo com a ideia de que a arte, quando colocada no mundo, pode ganhar significados muito diferentes do que imaginamos. Ela é viva e continua a se transformar nas interpretações de quem a vivencia.

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Isabel Bahé
Isabel Bahéhttps://linktr.ee/isabelfbahe
Estudante de jornalismo e bibliófila que respira músicas.