Entrevistamos BaianaSystem sobre disco “OxeAxeExu”

BaianaSystem
Foto: Divulgação.

No final de abril, a banda BaianaSystem divulgou o disco “OxeAxeExu” completo nas plataformas digitais. O lançamento do trabalho foi dividido em três atos: “Navio Pirata”, “Recital Instrumental” e “América do Sol”. O álbum chega também com uma faixa inédita, chamada “Brasiliana”, que conta com a participação especial de Chico César e do argentino Mintcho Garrammone.

A Nação da Música teve a oportunidade de conversar com Roberto Barreto, também conhecido como Beto, sobre o significado do disco, o motivo da divisão entre três atos, a saudade dos shows por conta da pandemia e também sobre as diversas colaborações do trabalho. Entrevista por Marina Moia.
———————————— Leia a íntegra:
Semana passada vocês liberaram o disco completo do BaianaSystem nas plataformas digitais, depois de dividi-lo em três atos. Primeiro de tudo, por que a decisão de dividi-lo assim e qual a importância dessa divisão para o trabalho como um todo?
Beto: Foi um processo bem longo e bem diferente desde que começou. Começamos no meio da pandemia, a gente tentando entender o tamanho da situação, desde o tempo que a gente ficaria e como seria, até o formato e o tamanho que isso teria. A gente fez a última apresentação em março (2020), depois teve o isolamento que a gente ficou abril, maio, daí a gente começou a produzir algumas coisas. Chegamos a lançar o “Futuro Dub” e o ao vivo com o [Gilberto] Gil. A gente começou então a produzir muita coisa e dentro do próprio disco tem momentos que se aproximam do momento de produção, de como aquilo era, algo muito em cima dos beats e de rima, depois a coisa acústica começa a aparecer, depois os instrumentais…

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Quando a gente percebeu que a pandemia iria durar mais do que todo mundo imaginou, que a gente já estava chegando no final do ano, vimos que tínhamos 17, 18 músicas e que seria algo muito grande para tocar de uma vez. Isso tem muito a ver com a nossa comunicação com o público dentro da situação em que a gente estava, já que não conseguimos fazer as lives, nem achar um formato para trocar esse sentimento com o público. A gente viu então que tínhamos muita coisa para soltar de uma vez. Ainda tinha a dúvida se teria Carnaval. Quando vimos que ia virar o ano e a gente já estava com o material, a gente veio com essa ideia de lançar por atos, mesmo ainda não estando tudo pronto 100%, apesar de estar encaminhando.

O primeiro ato “Navio Pirata” tem a ver justamente com onde a gente parou um ano antes, no Carnaval de 2020. As músicas que estão neste ato tem muito a ver com o universo do Navio Pirata, com o que seria esse possível Carnaval que acabou não acontecendo. Mesma coisa com o “Recital Instrumental”, que eram aquelas músicas que tinham caráter instrumental e orquestral, que caminhavam ali junto. E o “América do Sol”, que é essa coisa mais latina, que já vinha apontada no “O Futuro Não Demora” e que tinha a ver com outras coisas que a gente estava fazendo, com essa esperança e alegria forte latinoamericana.

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Isso nos ajudou na nossa comunicação com o público. A gente lançava um ato, entendia qual era a reação daquilo, via as conclusões das pessoas se era um disco ou não que estava vindo. Saiu primeiro o single “Reza Forte”, na sexta-feira de Carnaval, e todo esse assunto do Carnaval ficou ali por duas ou três semanas e a gente foi maturando o processo do “Recital Instrumental” e depois percebemos que isso tinha muito a ver com o que vinha acontecendo no país, com as pessoas, as sensações, e o “Recital” é mais pesado, mais denso. E o “América do Sol”, enfim, é essa esperança.

A gente sabia que tudo isso em algum momento ia virar o “OxeAxeExu” e que o formato dos atos não ia continuar necessariamente daquela forma, tanto que a ordem do disco final é outra. A gente queria que aquele roteiro caminhasse de outra forma do que a que encontramos para o lançamento dos atos, para a comunicação inicial.

Foi uma experiência que a gente muito provavelmente não teria se não estivesse numa situação de pandemia. De alguma forma, foi muito bom para a gente entender o material que estávamos fazendo e também para entender o público.

Eu ia mesmo comentar sobre a ordem das músicas, que foi algo que foi feito no disco final, além da adição da faixa “Brasiliana”. Isso causa uma experiência diferente em cada maneira de ouvir o trabalho, seja nos atos ou como disco completo.
Beto: Exatamente. A gente teve essa mesma sensação. Pra gente foi uma maneira de entender o que era a música, depois que vinha o “OxeAxeExu” com “Brasiliana” e como isso mexia com a roda.

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Assim como o disco anterior “O Futuro Não Demora”, esse trabalho veio recheado de participações especiais. Como foi esse processo de escolha dos artistas? E como foi trabalhar no contexto da pandemia?
Beto: Pra gente, essa questão das participações é algo que está com a gente desde o primeiro disco. Se você for ver, nele tem participação de BNegão, Lucas Santtana, Roberto Mendes, Gerónimo, e muitos outros. Já tinha muita gente nesse entendimento e que as músicas e os temas que a gente pensa naturalmente nos levam para as pessoas, pro sentimento que a gente quer pra aquilo. No primeiro disco, por exemplo, era algo que tinha muito a ver com lambada, com música latina, então tinha que ter o Gerónimo ali que é uma referência pra gente. Como você falou, em “O Futuro Não Demora”, tem os ritmos que vão trazendo aquelas pessoas e as referências para perto da gente.

Neste disco, é muito parecido no sentido de que tanto as músicas como as pesquisas de vinil acabaram sendo muito mais presentes, já que estava cada um em sua casa, produzindo remotamente. Consegui ouvir mais discos, no começo concentramos numa pesquisa grande de vinil e samples que a gente usou, e isso já veio trazendo muita coisa. De alguma forma, a gente conseguiu se aprofundar mais. Foi doido porque ao mesmo tempo que a gente perdeu esse processo direto, de não conseguir se encontrar pra ensaiar, pra compor, de estar sempre junto no estúdio gravando, a gente também passou por vários encontros com as colaborações, por facetime, por zoom, ligação, a gente mandava música, recebia de volta. E todo mundo estava vivendo algo muito parecido, já que é algo a nível mundial. Foi um aprendizado tanto pra gente, na nossa relação, que a gente foi reaprendendo, como nessa relação com tanta gente. Fora os produtores né, como o [Daniel] Ganjaman que trabalhou com a gente de novo num terceiro disco, Dudu Marote ali presente. Foi um exercício de ver o que a gente tinha e o que a gente conseguia trocar nessa loucura toda que a gente está vivendo.

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Você comentou sobre como a pandemia e o isolamento influenciaram na parte técnica, na prática do disco. Mas essa situação também afetou a criatividade da banda na hora de compor e de criar novas músicas?
Beto: Sim, eu acho que influenciou bastante. Primeiro a gente foi reaprendendo muita coisa né, era um momento muito de beat, de letra, e o Russo [Passapusso] estava provocando muito a gente pra ver o que a gente ia fazer, como ia fazer. Era um momento de muita escrita, muita letra, de coisas que a gente foi maturando junto. Foi diferente nesse sentido, de começar com letra e beat, porque não estava podendo ensaiar, não podia se encontrar pra tocar.

Nesse meio tempo, senti um pouco de dificuldade no meu processo de guitarra, de criação, de melodia. Eu não estava me achando muito naquele beat e acabei indo pra parte acústica que era algo que de alguma forma me trazia uma outra sensação. Tem muita coisa acústica nesse disco. Esse ambiente acústico se fez muito presente por conta disso e deu uma outra cara, que talvez se a gente estivesse só no estúdio tocando, não teria acontecido desta forma. A mesma coisa com as percussões, a forma como aquilo foi pensado, porque não exercitaram no estúdio ou em shows, que era algo muito comum da gente fazer. Então a gente tinha uma estrutura e juntos, no dia a dia, a gente ia percebendo o que aquilo ia trazendo. Acabava aparecendo mais coisas, já que a gente não tinha recurso do ao vivo, como o berimbau, coisas mais sutis de percussão aparecendo, então nesse sentido transformou bastante.

Tenho agora uma pergunta de uma colaboradora da Nação da Música, que é muito fã da banda, a Twany Carapello: Os shows de vocês são uma espécie de catarse coletiva, é possível sentir isso principalmente nos blocos de Carnaval. Como está sendo para vocês esse momento de isolamento, sem esta troca constante com os fãs, no ao vivo?
Beto: Essa talvez seja a coisa mais difícil pra gente nesse tempo. Ela foi no ponto que é um ponto que justifica algumas perguntas que estavam fazendo pra gente, sobre as lives, sobre uma maneira da gente se apresentar. A gente diz que é culpa do público [risos]. Porque quando você vai num show do BaianaSystem ou procura vídeos no Youtube, você vê praticamente o público em destaque, com todas as manifestações deles. Se a gente faz uma live, por exemplo, é como se o show estivesse sem uma parte fundamental dele, que inclusive tem muito a ver com esse nosso processo criativo que a gente levantou aqui, sobre o que influencia.

Às vezes a gente tinha uma ideia inicial, levava pro ao vivo, e a reação do público nos levava para um caminho. Essa falta do público, dessa sensação de catarse que é realmente uma sensação que a gente teve ali no Carnaval, que foi o último show que a gente fez antes de parar, e que é algo muito forte. Como você lida com a expressão artística sendo que você está privado desta sensação? Como a gente faz sem essa reação do público, sendo que sempre tem uma explosão, depois um mantra, depois um momento que você consegue trazer um respiro dentro daquilo? Tem tudo a ver com o impacto que o show tem na gente e no público. A gente ainda está entendendo e até a questão dos atos teve a ver com isso, a coisa do não Carnaval, do Navio Pirata, e está sendo um exercício pra gente entender como é o Baiana sem vários aspectos. Essa sensação é algo que alimenta tanto a gente como o público. Se construiu uma coisa muito sólida nesse tempo de shows e fica pra todo mundo essa sensação e nos alimenta. E muitas dessas novas músicas, a gente já fica imaginando qual vai ser a reação que ela está falando, essa explosão.

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A música de vocês é algo que a gente ouve a versão do estúdio já imaginando como seria a performance ao vivo. É muito legal!
Beto: [risos] Isso é muito legal mesmo. E mesmo a gente tocando em lugares diferentes, como no Sul do país, ou até fora do Brasil, tem alguma coisa que de alguma maneira incita essas sensações de explosão, respiro, a roda. A pergunta e a resposta constante. É realmente um ritual que se repete e consegue se colocar em muitos lugares.

Aliás, sei que são tempos incertos, mas o que podemos esperar do BaianaSystem para este ano, além do álbum inédito que acaba de ser lançado?
Beto: É, está sendo um pouco difícil se planejar porque a gente nunca sabe quando tudo vai voltar né. Cada hora tem uma previsão diferente de mês pra voltar o ao vivo. A gente conseguiu fazer o “OxeAxeExu”, foram mais de 20 faixas e mais uma quantidade incrível de trabalhos associados, com outras pessoas, uma produção que a gente estava muito envolvido e que a gente nunca tinha conseguido fazer antes. A gente sempre continua produzindo e às vezes mergulha até dentro do próprio material e continua a trabalhar. Gostamos muito também de trabalhar com trilha sonora. A gente continua nesse método de produzir e de entender como as coisas vêm. Sempre imaginando quando os shows vão poder voltar.

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Gostaria de deixar um recado aos fãs do BaianaSystem e aos leitores da Nação da Música?
Beto: Pensando no “OxeAxeExu”, nos atos que viraram um só, e esse processo que a gente conversou sobre se reinventar e de achar formas de criar tudo aquilo, e como essas relações estão mudando né. O nosso forte é essa comunicação com o público e a gente está achando formas e caçando maneiras de fazer isso. A gente tem muito disso, do coletivo e também do individual. A gente tem a necessidade de ter essa força que é o público e a vamos continuar fazendo o máximo que a gente puder para estabelecer essa comunicação. O último ato, “América do Sol”, tem essa mensagem de acreditar e de ir pra frente e com o fato de que a gente consegue se fortalecer com isso tudo que está acontecendo. Essa força latino-americana que a gente tem de acreditar na gente mesmo é o que está movendo todo mundo para ver o sol brilhar de novo.

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Marina Moia
Marina Moia
Jornalista e apaixonada por música desde que se conhece por gente.