Entrevistamos Dead Fish sobre novo disco de estúdio “Ponto Cego”

dead fish
Foto: Marcelo Marafante

A banda Dead Fish liberou na sexta-feira (31) passada seu mais novo disco, intitulado “Ponto Cego”. O trabalho sucede “Vitória”, que foi lançado em 2015.

O álbum foi produzido por Rafael Ramos, com quem os integrantes já haviam trabalhado anteriormente, e mixado por Bill Stevenson, do Descendents. As letras do trabalho são diretas, sem enrolação, e abordam a política no Brasil nos últimos anos, numa crítica não apenas ao governo em si, mas com a intenção de fazer um recorte de classe.

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A Nação da Música conversou com Rodrigo Lima, da Dead Fish, sobre a temática do disco, os bastidores da produção e até mesmo sobre a polêmica que rolou com a banda Dead Kennedys há algumas semanas.

Entrevista por Marina Moia.

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———————- Leia a íntegra.
Primeiro de tudo, gostaria de falar da repercussão da música “Sangue Nas Mãos”, que foi divulgada recentemente. Fazia tempo que não ouvia músicas com letras tão diretas ao ponto e com críticas tão pontuais. Como foi a recepção da música na opinião da banda? Surtiu o efeito esperado?
Rodrigo: A intenção desde o início da produção do álbum era escrever algo conceitual e direto e acredito que conseguimos. Quanto a recepção isso a gente não planeja, é um álbum pro mundo, principalmente pro Brasil de hoje. Nós gostamos demais do single e do lyric vídeo, fizeram um barulho legal, e estamos felizes pra banda esse é o efeito esperado. Deu tudo certo.

O disco como um todo é uma grande crítica ao governo atual, às desinformações, à política brasileira no geral. Críticas extremamente necessárias, diga-se de passagem. Como foi o processo de composição de “Ponto Cego”? Quando vocês perceberam que o álbum giraria em torno deste tema?
Rodrigo: A crítica é mais do que ao governo, a intenção é fazer um recorte de classe mesmo, pintar um quadro, ou revelar uma foto de tudo que estamos vivendo. O Bozo e seus palhaços nazis são só a cereja do bolo fecal.

Eu e o Alvaro Dutra, que mora em Brasília e me ajudou a escrever esse álbum, tínhamos reuniões quase diárias, conversas infinitas e muitos rascunhos. Chegamos no conceito do álbum quando ele desenhou no caderno de anotações dele, numa tarde juntos aqui em SP, um prédio com várias janelas. Percebemos que o que tínhamos que narrar era a realidade de uma bolha, de um condomínio e levar isso pra realidade dos fatos. Daí partimos.

Quais foram as principais diferenças na hora de trabalhar em “Ponto Cego” e “Vitória”, de 2015?
Rodrigo: Esse foi mais elaborado, o Ric está na banda faz algum tempo, está adaptado a dinâmica. Marcão e ele fizeram um laboratório sonoro bem grande e com tempo. Gravavam tudo, todos opinavam, conversavam. Eu levava meus pontos de vista e eles ouviam, foi um álbum bem mais cerebral, mais trabalhado, no meu ponto de vista.

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Como foi trabalhar novamente com Rafael Ramos, que produziu “Ponto Cego”? Como funciona a dinâmica entre vocês?
Rodrigo: Já conhecíamos ele. Ele nos gravou em três álbuns da banda, os caras todos queriam ele, queriam ter a experiência de ser produzido por ele. Foi crucial ter trabalhado nesse álbum porque ele é um baita produtor, mergulha como poucos no processo e ele trouxe mais pontos de vista e deu mais uma super lapidada.

Bill Stevenson mixou “Ponto Cego” e gostaria de saber como surgiu essa parceria com ele.
Rodrigo: Em 2016 já queríamos fazer um álbum novo, aí o Descendents veio pro Brasil e resolvemos que iríamos gravar no Blasting Room, estúdio dele nos EUA. Pedimos pro Fernando Sanches que produziu o “Vitória”, nosso penúltimo álbum, que passasse o contato dele e fomos ao show de São Paulo para conversar. Batemos um super papo e ele falou que faria um preço bem acessível para aquele tempo. Só que a preços de 2018 pós-golpe já não era mais convidativo. Durante a gravação no estúdio da Deck o nome dele surgiu de novo e o Rafael Ramos nos perguntou se conhecíamos o cara e se tínhamos o contato. Cá estamos, um álbum mixado por Bill Stevenson.

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No último mês, tivemos a polêmica da banda Dead Kennedys, que autorizou um poster contra o nosso governo atual, mas acabou se retraindo após críticas. Vocês tem alguma opinião sobre esse assunto? Como enxergam o panorama das bandas de rock e hardcore atualmente, em questão de se pronunciar politicamente e produzir músicas sobre o assunto?
Rodrigo: Eu tenho uma opinião sim. O Dead Kennedys é uma das minhas bandas preferidas porque tenho os álbuns cantados pelo Jello Biafra. Eu os conheci com 13 anos e eles ajudaram a formar minha estrutura óssea dentro do punk/hardcore. Não vou falar mal da banda, mas eles foram muito equivocados em muitas decisões, a do pôster foi um verdadeiro tiro no pé, eu fiquei boladíssimo com toda a treta, mas eles não erraram sozinhos.

Ouvi várias pessoas sobre o assunto e acho que foi uma sequência de erros trágica. O cara que fez a arte acertou em tudo; o pôster é muito perfeito pros dias de hoje, eu queria uma capa de disco como aquele pôster. Os caras da banda ficaram com medo das ameaças online, no meu ponto de vista, e eles não são daqui. Não entendem como funciona a dinâmica distópica local, apesar de terem o Trump. Os coxas nazis daqui usam robôs falam merda pra caralho e ameaçam. Acho que isso os deixou desorientados, mas isso podia ter sido amenizado com a produção daqui, alguém tinha que explicar.

Enfim, deu essa merda toda e a banda saiu queimada pra cacete, mas acho, sem muita certeza, que eles não são uns bundões que estão tentando pintar aqui no Brasil.

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Aqui perto de mim todos tem uma postura política muito parecida com a nossa. Tanto amigos como bandas amigas. Vejo hoje pouca diferença nos discursos das bandas próximas. É um momento de mais ainda de política e de pontuar ainda mais a situação. Acredito até que o momento tem feito as pessoas estarem mais unidas e dispostas a lutar contra essa merda toda da atualidade.

Ainda seguindo esse raciocínio, acreditam que surgirão novas músicas de outras bandas, abordando o tema de forma dura também? Não necessariamente do rock, mas também de outros estilos.
Rodrigo: Já está acontecendo. Ontem ouvi o álbum do Jair Naves por recomendação de um amigo e o teor é muito politizado. De forma menos direta, mas ainda assim bem forte nesse sentido de falar do hoje.

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O show de lançamento, que vai ter participação da banda Braza, já está praticamente esgotado. O que os fãs  esperar desse show e da próxima turnê como um todo?
Rodrigo: Que bom que esteja quase esgotado. Ficamos felizes com a consideração das pessoas e o respeito delas pelo nosso trampo por tanto tempo.

Eu quero falar pra todo mundo do Brasil, da América do sul e do mundo nesse álbum. Quero ir a lugares que nunca fui, quero conhecer mais bandas, quero pagar as contas falando e fazendo o que mais gosto que é tocar. Basicamente isto.

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Gostariam de trabalhar em estúdio ou ao vivo mesmo com quais bandas ou cantores?
Rodrigo: Com geral que tem uma mente progressista, com quem quer fazer a diferença pras pessoas e não ser só entretenimento. Quero dividir com todo mundo esse momento, de “raperos” até músicos instrumentais, do povo do grind até o povo do samba. É o momento.

Gostariam de deixar um recado aos leitores da Nação da Música?
Rodrigo: Obrigado pela oportunidade de falar pro seu veículo. Contem conosco. Abraço.

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Marina Moia
Marina Moia
Jornalista e apaixonada por música desde que se conhece por gente.