Entrevistamos Fresno sobre “Sua Alegria Foi Cancelada”

Fresno
foto: Camila Cornelsen

Praticamente de surpresa, a banda Fresno liberou em julho o novo disco “Sua Alegria Foi Cancelada” nas plataformas digitais. Este é o oitavo trabalho de estúdio do grupo. 

Com participações de Jade Baraldo e Tuyo, o álbum conta com dez faixas e é sucessor de “A Sinfonia de Tudo que Há”, de 2016. 

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A Nação da Música conversou com o vocalista Lucas Silveira sobre a produção do novo trabalho, as colaborações e sobre a relação próxima com os fãs da banda.

Entrevista por Marina Moia e Henry Zatz.

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—————————– Leia a íntegra:
Como foi o processo de produção e criação desse disco? Quão diferente e/ou similar foi do anterior?
Lucas: Procuramos um caminho totalmente diferente daquele tomado no “A Sinfonia de Tudo que Há”. Naquela ocasião, foi um disco que gestamos com muitos ensaios, e nesses ensaios as minhas demos se transformaram em coisas diferentes. Esse é o processo mais comum, que tem seus prós e contras.

Numa banda com a nossa estrada, ensaiar antes de gravar pode levar o artista a cair em vícios e soluções “de sempre”, o que é sempre um perigo. É muito fácil se repetir, dessa maneira, e é um processo que eu recomendo apenas se for justamente essa a intenção.

Já o “Sua Alegria” surgiu em torno das demos. A banda toda foi colorindo e adicionando coisas às demos que eu tinha feito no momento da composição das faixas. Isso conservou muito da intenção original das músicas, inclusive takes de voz, guitarra, e isso é muito facilmente perdido quando se toca um repertório até a exaustão. 

 Como foi colaborar com Jade Baraldo e Tuyo no disco? Com quais outros artistas gostaria de fazer parcerias?
Lucas: É um misto de oportunidade com disponibilidade. Procuramos sempre artistas que admiramos e para os quais podemos dar um palanque extra. No caso de Jade e Tuyo não foi diferente. São bandas mais novas, artistas de outra geração que comungam muitos aspectos da composição com a gente, embora em estilos bem diferentes. São todos autores de canções sofridas, cada um na sua linguagem.

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Esse disco é bem sofrido e a adição tanto da Jade como do Tuyo só deixou o troço mais complexo e também completo. Espero que para eles esteja sendo tão massa quanto está sendo para nós. O fã que já curte as duas partes fica muito feliz com o ‘ship’ e também muita gente que não conhece algum dos artistas passa a conhecer com simpatia extra. Fora isso, os feats ajudam muito a aumentar a exposição de uma faixa nas plataformas de streaming, o que embora não seja o motivo principal, é um fator a se considerar na hora de planejar um lançamento.

 A fã Julia Poci nos enviou uma pergunta: No Gugacast você comentou sobre a ordem cronológica dos trabalhos, comparando com as fases já vividas pela banda. Qual seria então a história por trás desse novo disco?
Lucas: Este disco foi se construindo em torno de “Natureza Caos” e, até um dado momento, ia ter esse mesmo nome. No entanto, tudo mudou em uma semana ou duas que foram bem péssimas na minha vida pessoal e profissional, que culminaram com uma composição frenética de muitas faixas, todas elas simples e bem soturnas. Mostrando isso para os rapazes da banda, ficou claro que o disco na real era aquilo. Era sobre aquilo, inclusive o que não parecia ser. O resto do processo foi preencher as lacunas e pensar em como traduzir isso para a arte, pro show, pra comunicação da banda. Como amarrar tudo e transmitir a ideia da ‘Alegria Cancelada’ e levá-la a máxima potência.

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 Este é um álbum que carrega uma tristeza. Em outros trabalhos da Fresno, o sentimento também aparece. Mas que diferença você enxerga no “Sua Alegria Foi Cancelada?” E como procura trabalhar a emoção nas músicas?
Lucas: Dá pra fazer música sem tocar em assuntos sensíveis e fortes, mas eu simplesmente tenho dificuldade em colocar esse tipo de abordagem na Fresno (e nem quero!). Todos os discos têm sua carga de tristeza, mas a Fresno sempre se utilizou do drama para externar essa tristeza, essa melancolia.

Com esse disco, nós extirpamos o drama, matamos o drama, e mostramos o nosso sentimento como ele é, monótono, repetitivo, que te mata lentamente. Se ainda existe drama, ainda existe sonho e vontade, ainda existe emoção. A real tristeza é a morte da emoção, não uma emoção exacerbada. O que se vive hoje em tempos digitais, principalmente nas grandes cidades é justamente essa tristeza. O drama se foi e ficou somente a letargia, o sonho extinto, deletado com um clique. É isso que dizem os versos da faixa-título do disco. E é isso que diferencia esse disco dos outros, na parte das letras.

 Vocês já avisaram nas redes sociais que a turnê começa no próximo semestre. Já estão se preparando pra ela? O que pode contar sobre os shows que estão por vir?
Lucas: Fizemos um aquecimento para a tour, com o show em Brasília no festival COMA. Foi simplesmente maravilhoso, mas vai ficar ainda melhor. Serão poucos – e antológicos – shows, para os quais estamos nos preparando com toda a calma e dedicação que há em nós. Vamos priorizar o disco novo, e dentre o nosso repertório clássico também procuraremos canções diferentes, que conversem com essas novas. É um trabalho ainda em progresso, mas que vai ser lindo de desfilar na rua.

Agora vocês possuem um grupo no Facebook, o #F8, com quase 5 mil membros já. Como surgiu a ideia de fazer o grupo? Como funciona a interação entre a banda e os fãs pela internet?
Lucas: O grupo surgiu da necessidade de encontrar os fãs mais presentes da banda. Temos talvez milhões de fãs e simpatizantes no Brasil, mas quantos se relacionam com o nosso trabalho de forma realmente profunda? Existe um recorte pequeno dessa amostra gigante aí. Somos a banda preferida de quantas pessoas? Por isso o grupo, e do grupo começou um trabalho de feedback e alimentação do nosso processo criativo, principalmente na fase pré-lançamento. Agora, pós-lançamento, é a nossa bolha, onde as discussões mais profundas sobre o trabalho acontecem, relações começam e terminam, amizades surgem, etc. Está sendo um experimento de marketing, e também algo que restaurou em mim essa comunicação perdida com a galera. 

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Lucas, você também é produtor, trabalha com diversas bandas, produziu inclusive o disco mais recente do Capital Inicial. Sente muita diferença entre produzir e criar pra Fresno e pra outras bandas? Como funciona esse trabalho pra você?
Lucas: São trabalhos diferentes, pois no caso do Capital, eu não faço parte da banda. Logo, me restrinjo a propor caminhos artísticos. Com a Fresno, isso é diferente, pois eu também estou criando as canções com os caras da banda, então o lado produtor fica mais pelo fato de eu ter um estúdio e eu estar envolvido em composição, captação e mixagem, ou seja o pré, o durante e o pós, mas eu não apenas aponto caminhos e proponho coisas. A discussão é diferente e tem input da banda em todos os momentos. Basicamente, são duas personas diferentes. 

Na hora de escolhas artísticas, que caminho vamos seguir, é uma conversa entre 4 pessoas. Nada é imposto. E nas democracias existem discussões importantíssimas para o resultado final, mesmo que seja um exercício eterno de lidar com os egos e com as diferenças, mas é isso que torna o trabalho bonito. Nessa soma. Tem um monte de cada um de nós em todo disco, até mesmo numa música que não tem bateria, tem o Guerra ali, pois um disco é feito de escolhas, não de takes ou instrumentos. A ideia de ter “O Ar” no “Sinfonia” foi coisa do Vavo. A ideia de não haver baixo elétrico em várias faixas do “Sua Alegria” surgiu de uma sessão em que estávamos somente eu e o Mario. O Arrocha deixou de ser vinheta e virou música por causa de um telefonema em que o Guerra me revelou seu momento de Eureka. Isso só pra ilustrar que a colaboração artística pode acontecer de mil formas. 

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E no Brasil, muitas das bandas emo que surgiram na mesma época que vocês não estão mais na ativa. Como você enxerga este cenário aqui e lá fora? E o que tem ouvido recentemente?
Lucas: Isso dá a impressão de que o emo morreu, mas se você pegar qualquer banda que estava na ativa em 2008, vai perceber que dificilmente bandas duram tanto tempo quanto a gente está durando. Por que durar 20 anos fazendo a mesma coisa? São muitos fatores que mantêm um trabalho artístico de fé, uma equação de egos e temperamentos, finanças, similaridades ideológicas… fora isso, eu vejo muita coisa boa surgindo. Coisas surpreendentes, como a Vivian Kuczynski, que é menor de idade e tem uma maturidade que simplesmente não faz sentido, e ainda vai fazer muita coisa foda, além de uma outra geração de bandas que exploram emoções fortes de formas diferentes e modernas, como o Raça ou o Menores Atos.

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Tem muita coisa foda rolando no rock, mas impossível acompanhar tudo, e desafiador conseguir aparecer na avalanche musical que toda semana é lançada nas plataformas, em uma sociedade com cada vez menos tempo, dinheiro e disposição para o lazer e a cultura.

O panorama político atual, dos últimos anos, no nosso país não tem sido muito animador e essa situação reflete muito na cultura. Temos o disco novo do Dead Fish, por exemplo, muito afiado em relação ao tema, às críticas ao sistema e ao governo. Vocês pretendem abordar e entrar mais explicitamente em temas políticos em trabalhos futuros? Qual a responsabilidade e o papel de cantores e bandas com a política?
Lucas: Não é exatamente um plano, mas na real sempre foi um norte: a gente se guia pelo que nos incomoda, pelo que dói. E hoje, pura e simplesmente, existem coisas que estão doendo ainda mais do que o coração partido. Tem que ser muito cego ou incrivelmente privilegiado para não se deixar afetar pelo retrocesso que é plano diretor desse governo e do capital conservador, que é quem de fato opera as marionetes. O atraso e a intenção de prejudicar todos os setores que promovem evolução pessoal e questionamento tem um porquê, e cabe à arte, uma das áreas mais odiadas por quem odeia progresso e odeia ser questionado, colocar um holofote nisso.

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A Fresno completa 20 anos neste ano. Qual o balanço que você faz da banda nesse período todo? O que está nos planos da banda para o futuro?
Lucas: A banda só tem todo esse tempo porque o nosso chamado não é sobre ser famoso, ou ser rico, ou ter o saco puxado por todo mundo. Em algum grau, experimentamos sempre algum desses três fatores, mas eles se vão com o vento, com as tempestades e com as voltas que o mundo dá. Só fica a motivação real, que é de se expressar e propor com isso uma conversa com milhares de pessoas, e se sair como alguém melhor do outro lado. Se não fosse por isso, a gente teria acabado no primeiro contratempo, na primeira treta, no primeiro sonho despedaçado. 

Gostaria de deixar um recado aos leitores da Nação da Música?
Lucas: Muito obrigado a todos os nossos fãs que nos apoiam durante todos os últimos anos e espero que vocês escutem e curtam cada música do nosso novo álbum. Fizemos este trabalho com muito carinho!

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Marina Moia
Marina Moia
Jornalista e apaixonada por música desde que se conhece por gente.